quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Orgulho e Preconceito

O grande problema de um roteirista ao adaptar um livro para o cinema, seja ele qual for, é conseguir captar todas as nuances que o escritor deu ao seu trabalho na transposição. Justamente na forma como o roteiro de "Orgulho e Preconceito" foi tratado que reside o seu maior defeito: falta-lhe a ironia fina, a sagaz observação aos padrões da época que permeia cada entrelinha dos escritos de Jane Austen.

Austen (1775-1817), nascida em Hampshire, Inglaterra, foi a filha caçula de oito irmãos de uma família tradicional. Escreveu, aos quinze anos de idade, seu primeiro romance, Amor e Amizade, e em 1796 deu cabo a Primeiras Impressões, que acabou sendo recusado por um editor. Austen então o reescreveu totalmente, e o rebatizou de Orgulho e Preconceito, sendo este lançado somente em 1813, e que acabou se tornando seu romance mais famoso.

Orgulho e Preconceito, assim como as demais obras de Austen, acabou recebendo várias adaptações para o cinema. Greer Garson e Laurence Olivier, em 1940, já travavam as batalhas intelectuais do romance. Em 1995, foi a vez de Jennifer Ehle e Colin Firth, em uma aclamada minissérie feita para a televisão britânica. Dessa vez, os papéis principais ficaram com a irradiante Keira Knightley e o soberbo Matthew Macfadyen.

A história do filme (ou do livro, como preferir) se centra na tradicional família Bennet, onde Sr. (Donald Sutherland, em notável atuação) e Sra. Bennet (Brenda Blethyn, escorregando de vez em quando) estão às voltas com o alvoroço que um recém-vizinho rico, Sr. Bingley (Simon Woods), tem causado em suas cinco filhas, principalmente em Jane (Rosamund Pike), que enxerga nele o casamento dos seus sonhos. Naquela época, o enlace matrimonial era coisa séria: não casar significaria à pobre moça o estigma de solteirona, perdedora e infeliz. Portanto, não casar não era uma atitude feminista, simplesmente não era adequado à época.

Elizabeth Bennet (Knightley) é uma moça à frente do seu tempo. Não tão bonita quanto a sua irmã e de uma sagacidade e inteligência superior, ela enxerga com outros olhos a vida e o seu destino. Mas acaba envolvida com o melhor amigo do Sr. Bingley, o aristocrata e pedante Sr. Darcy (Macfadyen). Inicialmente, como em toda história de amor que se preze, eles não se bicam: ela, por achá-lo soberbo; ele, por desprezar a condição social dela. Depois, ele acaba por se apaixonar por ela e, mesmo amarrado aos preceitos da época, se declara, mas é rejeitado. Até que enfim acertam os ponteiros.

É uma história de amor, sim, e das mais belas, mas o que falta ao filme é exatamente um olhar mais satírico por parte da roteirista estreante em cinema Deborah Moggach. Tanto é que o filme muitas vezes percorre a perigosa linha do "filme açucarado de mulherzinha". Mas há de elogiar o roteiro em uma questão: há diálogos inteiros do livro fielmente transpostos, algo rarísismo de se ver hoje em dia, o que prova que a roteirista manteve, acima de tudo, o respeito pela obra em questão.

O diretor Joe Wright, egresso da tevê e também estreante na tela grande, faz um trabalho bastante acadêmico, bem quadradinho. Pausado, não tem pressa em construir seus personagens e consegue envolver o espectador – e nesse ponto ajuda, e muito, a climática e solar trilha de Dario Marianelli. Em certo momento, a câmera de Wright passeia por cômodos mostrando vários personagens, em um belo momento de arrojo. Deve ter deixado James Ivory morrendo de inveja.

(Por Andy Malafaya, no site Cineplayers)

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